Essas mudanças poderiam inclusive afetar a forma como a própria igreja enxerga seu papel como instituição, e sua relação com as demais religiões do mundo.
“Seria o momento de a igreja repensar e colocar na linha de frente um colégio de cardeais que possa pensar em levar adiante o processo de diálogo, que caminha mais para o pluralismo religioso do que para o conservadorismo”, diz o professor da PUC-SP (Pontifícia Universidade Católica de São Paulo) Rafael Rodrigues da Silva, especialista em Ciências da Religião.
Silva acredita que a decisão de Bento XVI não foi tomada do “dia para a noite”, e reforça a ideia de que a renúncia do Papa teve contornos políticos internos da igreja: “Você tem um grande conjunto de grupos, movimentos e disputas internas de poder. E, além da força dos grupos conservadores e moderados, há os casos de pedofilia. E a grande dificuldade de responder, como grande líder, a isso tudo pode estar na raiz do próprio exercício de poder de Bento XVI”, afirmou o professor, em entrevista ao Uol.
O escritor e jornalista Juan Arias, que foi correspondente do jornal El Pais no Vaticano por 14 anos, afirma que a renúncia de Bento XVI pode ter sido uma reação a uma conspiração: “Parece que esses escândalos relacionados ao mordomo (Paolo Gabriele, mordomo de Bento XVI que foi julgado e condenado pela acusação de vazar documentos confidenciais do Vaticano) estariam relacionados à conspiração de um grupo dentro da Cúria Romana, preparando já um sucessor. Eles querem a volta de um papa italiano. Pode ser que ele quisesse desmascarar isso”, teoriza Arias, em entrevista ao Estadão.
Juan Arias afirma ainda que Bento XVI foi “o papa mais conservador destes últimos tempos. Foi um grande inquisidor, acabou com a Teologia da Libertação e – justo ele – faz o gesto mais progressista da história da Igreja. Em primeiro lugar, ele é um grande político. Tão político que fez tudo no conclave anterior para ser eleito”, disse, mencionando a renúncia como uma postura de evolução da Igreja Católica.
A renúncia em si, para Juan Arias, é um fato “histórico” e “novo”, e pode revolucionar a forma como a Igreja Católica elegerá o próximo pontífice: “Em primeiro lugar, cai o tabu de que o Papa tem de ser papa até o fim. Na sucessão, seguramente haverá muita influência de Bento XVI. Será a primeira vez na história que se vai nomear um papa com outro ainda vivo. Que influência ele terá no conclave? Não temos como saber, porque é inédito”.
Para o professor Rafael Rodrigues da Silva, independente das questões políticas, esse seria o momento de a Igreja Católica rever os conceitos e retomar mudanças propostas nos anos 1960: “Neste momento, seria o ideal que o novo pontificado busque retomar aquilo que foi o princípio do Concílio Vaticano 2º, uma nova discussão sobre a colegialidade (…). No Concílio, o ponto de partida da igreja era o povo para chegar aos próprios representantes, você tem um novo jeito de ver a igreja”.
Por Tiago Chagas, para o Gospel+
FONTE: Gospel +
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